Coisas do pai VIII

“O que hoje é drama, sempre amanhã, estará quieto na memória.” Caio F. Abreu

Está mentindo quem disser que é fácil aceitar o fato de ver os seus pais envelhecerem. Que é fácil vê-los falando nada com nada. Que é fácil vê-los não conseguindo se levantar. Que é fácil perder uma referência em vida. 

Mente quem diz que é fácil vê-los sem roupa na hora do banho encurvados – como se a vida que passou pedisse uma reverência – em cadeira de roda porque nem a perna e nem coluna agüentam mais o peso de tantos anos e tantas experiências. 

Mente quem diz que é fácil ficar acordada noites inteiras porque o pais estão com insônia, ou tiveram pesadelos, ou simplesmente querem jogar uma “prosa” fora. 

Mente quem diz que é fácil trocar a fralda deles quando sabemos que a vida foi uma pessoa de valores rígidos, personalidade forte e, em alguns momentos de lucidez, a gente consegue ver claramente o constrangimento nos olhos deles. 

Mente quem diz que é fácil convencê-los que aquela casa, aquele quarto é a casa e o quarto deles. Mente quem diz que é fácil repetir a cada 3 minutos que estamos em casa. Que não vamos embora para lugar nenhum. Que ali é e sempre a casa deles.

Mente quem diz que é fácil vê-los ingerindo só líquidos porque não conseguem nem levar colher à boca mais. E que é fácil engasgar mesmo com aquela sopa. 

Mente quem diz que não adianta chorar quando, às vezes, é a única coisa que nos resta. Quando as forças vão se esvaindo e nos alcança a desesperança como a de um inverno rigoroso e longo.





E fala a verdade Clarice Lispector quando diz que se aceitar, dói menos.


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